Do dia que soou o grito lá em casa, que eu achei que era chuveiro queimado e era um Vicente que tava pra vir, até ontem, supostamente passou-se quase 4 anos. Na prática foi como morrer e nascer de novo.
Efetivamente o Victor que existia antes do grito não existe mais. Morreu, ficou por lá, numa outra existência, num metaverso qualquer. Entender que seria preciso morrer e nascer outro, nascer pai, compreender a existência de outra forma, paradoxalmente menos metafísica e muito mais real, mais pé no chão, é um processo dolorido. Quem disser o contrário não viveu, é fato.
Quem esteve vivo sabe a dor de perder um eu e fazer nascer outro, sem que ninguém te perguntasse se queria ser ainda o outro.

Mas se é dor, é também muito bonito, muito engrandecedor, a gente cresceu e não foi pouco. E por ter de crescer ensinando um outro serzinho a crescer também é que a gente se perde na tradução. É para dar bronca? Mas não tá cedo para bronca? E conversar, adianta? Ele entende? Eu sei o que eu tô sentindo? E como esperar que ele saiba?! Ah, é fome. Ah, é sono. Ah, é cólica. Ah, não sei, não é nada e é tão tudo.
Um dia você aprendeu a sorrir e ao fazer isso me ensinou como é que fazia. No outro você aprendeu a rolar e eu quase morri achando que tinha perdido você na sala. Até o Chaplin riu de mim, você gargalhava, feliz de descobrir um jeito de se mexer.
Um dia você tomou vacina e só dormiu no meu colo. Ficamos ali umas 4 horas, meu braço doendo e eu pensando “será que ele tá conseguindo descansar?”. Porque o nosso descanso só existe com o seu, meu filho. Nosso sono é o seu.

Um dia você aprendeu a ficar em pé, no outro tava correndo. E um dia você descobriu as cores, no outro viu o Sol se pôr. Um dia você aprendeu a descer a escada e no outro entendeu como fazia pra desparafusar a grade de proteção.
Cada descoberta um sorriso, cada sorriso um EUREKA. E um dia tudo mudou, a gente precisa sair da casa que você aprendeu a conhecer cada cantinho. A gente tentou evitar mas o mundo chegou mais cedo na nossa bolha. Então toca achar um outro canto pra chamar de casa.

Foto: Dani Batista
E quando tá tudo bem a vida tira seu irmão da gente. E as idas para a creche ficam menos alegres. Vez em quando você lembrava dele e perguntava “Cadê Chápin?”, generoso que é, nunca achou justo passeio só com a Iracema.
A vida corre que nem você, meu filho. E é preciso tirar uns momentos pra observar, como se a gente não existisse e fosse só um visitante. Só assim a gente entende a alegria de você. Só assim a gente repara que quando você limpa meu beijo dá um sorriso de canto porque sabe que eu vou resmungar.
Num dia tá tudo bem, no outro a gente escolhe uma creche que te deixa de canto, esquecido. E você para de comer, para de brincar, para de dormir. E se o processo foi dolorido pra mim, que escolhi a creche e deixei meu filho ali, esperançoso de que seria bem cuidado, imagino a sua dor, meu filho. De se sentir esquecido, de preferir dormir a correr, logo você que nunca soube andar, que nunca soube diminuir o ritmo, sempre cheio de vida, de alegria, de sorriso.
É por isso que vez em quando a gente encolhe, filho meu, e te abraça e te aperta. Porque a gente erra, é verdade, mas é sempre querendo teu sorriso, tua alegria, nosso combustível. E essa semana, inegável, como você foi feliz!
A creche, que a outra, ignorante e estúpida, chamou de bagunça, te presenteou. Coisa simples, como a vida tem que ser. Um desenho feito pelos coleguinhas, de presente de aniversário.

E o pesadelo ficou para trás. Exceto um dia, que você acordou fugindo de um gato do seu sonho, que devia ser terrível porque a grita foi alta. A gente ri, depois que passa.
E você ganhou sua primeira festa. E que festa, hein filho? Pula-pula das 11h às 17h, sem parar um só segundo. Corre daqui, corre de lá. Que bom que é te ver sorrir meu filho. Que professor você é.
Te amo, meu filho, parabéns pelos 3 anos de vida. Que você siga sorrindo e eu continue aprendendo como é que é crescer.
Meu Deus chorei aqui….
Eu tive que vir aqui ler esse texto, porque seus textos são lindos e esse mais uma vez me emocionou! Parabéns Vicentinho, parabéns família linda! Que texto em vitor!